A natureza da Regeneração

Uma transformação instantânea do ser humano o afeta por completo.

A palavra regeneração (palingenesia, palin, de novo e gênesis, de começo – novo começo) em toda a Bíblia só aparece duas vezes, a primeira em Mateus 19.28 referindo-se à vindoura renovação do cosmos no fim das épocas (At 3.21); a segunda em Tito 3.5, onde Paulo faz referência a Deus nos salvando “mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo”. Aqui está em foco de maneira clara a vivificação espiritual do crente, o que nos interessa no momento.
Com respeito a este renascimento, diferente de palingenesia, outras palavras expressam a mesma realidade:
• Genao, Anothen, Anagennao, significam criar ou recriar, produzir ou dar a luz – Jo 1.13: “Os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade homem, mas de Deus”. Em outras referências temos a mesma idéia: Jo 3.3−8; 1 Jo 2.29; 3.9; 4.7; 5.1; 1 Pe 1.23.
• Apokueo significa gerar ou produzir – Tg 1.18: “Segundo o seu querer, ele nos gerou pela palavra da verdade, para que fôssemos como que primícias das criaturas”.
• Ktizo significa criar – Ef 2.10: “Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para as boas obras...”.
• Suzzoopoieo significa dar a vida com ou vivificar com – Cl 2.13; Ef 2.5: “Estando nós mortos em delitos, nos deu vida juntamente com Cristo...”.

Em relação à natureza da regeneração, assim se pronunciou Wayne Grudem em sua Teologia Sistemática: “O que ocorre na regeneração de forma exata é um mistério para nós” (Vida Nova, 1999, p. 585). No mesmo pensamento Anthony Hoekema em Salvos Pela Graça, disse: “A regeneração é profundamente misteriosa” (Cultura Cristã, 1997, p. 107). É certo que estes teólogos tinham em mente o capítulo três do evangelho de João e, em especial o versículo oito: “O vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não se sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito”.

Em seu diálogo com o religioso Nicodemos, Jesus lhe ensinou muito bem acerca do novo nascimento e de quem o opera. Para isso usou como ilustração o vento. Dizer que “o vento sopra onde quer”, é lhe atribuir soberania. “Ouves a sua voz”, podemos ouvir e ver o toque do vento nas árvores, águas e dunas, mas não podemos entendê-lo. Há algo de misterioso em torno do vento. Não podemos sondá-lo, nem agarrá-lo, mas podemos observar e sentir os seus resultados. “Assim é todo aquele que é nascido do Espírito”. Jesus estava ensinando a Nicodemos que ao executar o novo nascimento, o Espírito Santo o executa de maneira soberana e misteriosa. O nascimento é do alto, de Deus. Assim como o vento em todo o seu mistério sopra onde quer, o Espírito Santo misteriosamente vivifica aqueles que estão mortos segundo sua livre vontade. Esta é a mensagem do evangelho. Sabemos que de algum modo nós que estávamos espiritualmente mortos (Ef 2.1), fomos vivificados por Deus e passamos a ser novas criaturas (2Co 5.17), não gradualmente, mas instantaneamente. Agora, não devemos mais viver na prática do pecado (1 Jo 3.9); cremos que Jesus é o filho de Deus (1 Jo 4.1), portanto, podemos vencer o mundo (1 Jo 4.4).

Em termos negativos, regeneração não significa uma mudança ocorrida na substância da natureza humana. No Novo Testamento não existe introdução de algo real, substancial. A regeneração não é algo físico; não significa adição ou subtração às faculdades da alma que são: mente, memória, afeto, vontade e consciência. Não significa apenas reforma moral. Presos podem ser moralmente reformados e ainda continuarem sem o novo nascimento. Não significa também que o homem se torne um semideus, divino. A regeneração significa segundo Martin Lloyd Jones em seu livro, Deus O Espírito Santo “a implantação de um princípio de nova vida espiritual e uma mudança na disposição governante da alma” (PES, 1997, p. 103). Louis Berkhof em sua Teologia Sistemática também vê a natureza da regeneração desta mesma forma:
Implantação do princípio da nova vida espiritual no homem, numa radical mudança da disposição dominante da alma, que, sob a influência do Espírito Santo, dá nascimento a uma nova vida que se move em direção a Deus. Esta mudança afeta o homem por completo: o intelecto, 1 Co 2.14,15; 2 Co 4.6; Ef 1.18; Cl 3.10; a vontade, Sl 110.3; Fl 2.13; 2 Ts 3.5; Hb 13.21; e os sentimentos ou emoções, Sl 42.1,2; Mt 5.4; 1 Pe 1.8 (Cultura Cristã, 2001, p. 432).

Devemos entender que a regeneração como uma transformação instantânea do ser humano o afeta por completo. Não é dizer que, por exemplo, o intelecto do homem depois de regenerado passa a ser maior do que antes, ou mesmo, passa a ser mais afetuoso. Não é isso. O seu intelecto e afeto continuam sendo os mesmos; apenas com uma crucial diferença: a sua disposição, que está por trás das faculdades, mudou. Agora, o indivíduo que odiava o evangelho, não o odeia mais; que resistia ao Espírito Santo, não lhe resiste mais; que ficava longe da igreja, não fica mais; que fazia de tudo para não ouvir falar de cristianismo, agora faz gosto em ouvir sobre o seu Salvador. Isto é regeneração. Isto é novo nascimento.

Vilmar Rodrigues Nascimento - www.icrvb.com | 2008-02-03 02:04:40





Opinião

O evangelho não é uma doutrina de língua, mas de vida. [João Calvino]